Sim, vem com algum atraso face ao habitual. Ainda a tentar recuperar, com fita cola, canja de galinha e longos banhos, do cansaço feliz de uma Lisboa Games Week recheada de coisas boas. Um evento onde houve um pouco de tudo, para quase todos os gostos.
Não falarei por aqui dos torneios, das competições e das equipas presentes nas secções e palcos onde se jogou Counter-Strike: Global Offensive, League of Legends ou Overwatch. Outros compromissos me afastaram de poder usufruir desse ambiente competitivo, sendo que o Rubber Chicken se encontrava mais pelo pavilhão Multiusos, onde o Indie Dome e o auditório do ISCTE exigiam a nossa atenção e envolvimento. Ora as galinhas, como se sabe, não voam, esvoaçam, pelo que nos é impossível estar em todo lado. No entanto, se Maomé não vai à montanha, arranjamos maneira de trazer a montanha a Maomé. E foi no auditório do ISCTE que tive a honra de moderar um painel sobre Organizações de eSports em Portugal que trouxe ao palco algumas caras incontornáveis dos eSports em Portugal. Sendo o painel mais numeroso dos que pisaram aquele palco, é ainda assim curto para todas as caras, organizações e sectores de eSports que poderiam estar lá representados. Ainda assim, foi um painel diversificado e com um fio condutor bem definido. Pedro ´Spirit´ Fernandes, líder dos K1ck, esteve lá como representante da equipa mais antiga e mais bem sucedida em Portugal. Ramiro Teodósio, da For The Win, como uma espécie de estrela em ascenção, com o seu projecto a alcançar o topo num espaço de tempo relativamente curto. Pedro Silveira, responsável pela entrada do Sporting Clube de Portugal nos eSports, representa esta nova vaga de interesse dos clubes de futebol no apelativo mercado dos desportos electrónicos. André Gonçalves, representante da Asus, deu a cara pelos patrocinadores, pelos investidores na scene de eSports portuguesa e, a fechar o painel, João Semedo, CEO da NPC, um dos organizadores de eventos em alta, em Portugal. Não sendo eu o responsável pela elaboração do painel, estou portanto perfeitamente à vontade para elogiar a diversidade e o tal fio condutor lógico.
Pois bem, e de que se falou? Daquilo que vai sendo comum falar-se quando se fala de eSports em Portugal. Das dificuldades. Da falta de apoios, da falta de eventos, da falta de público, da falta de faltas de faltas… A scene portuguesa tem ainda muito que crescer. Temos equipas a pôr-se em bicos de pés lá fora, mas continuam a ser uma honrosa excepção e ainda somos, regra geral, vistos como outsiders. A pescadinha de rabo na boca que envolve a relação evento – competição – público – patrocinadores tarda em desenvolver-se porque nenhum dos pontos assume uma verdadeira força dinamizadora. E sem esse abanão na estrutura, não consegue reforçar-se o crescimento como um todo. Se, por exemplo, o público aumenta, o mercado publicitário torna-se mais apetecível, pelo que os valores investidos aumentam, o que leva a que os eventos organizados tenham outro tipo de produção e melhores prémios o que, por sua vez, estimula a competitividade entre as equipas e atrai mais público, realimentando o ciclo.
A questão é que, por cá, a coisa tem andado a crescer lentamente. O número de eventos não é abundante. A competitividade resume-se a um punhado, ou menos, de equipas, que disputam ciclicamente o top 3. O público nem sempre adere, umas vezes por comodismo, outras pela tal falta de competitividade (ou, como dizem, “ganham sempre os mesmos”), outras ainda porque falta aos eventos de eSports portugueses algo além da competição – vender o evento como uma experiência abrangente. Uma abordagem próxima daquilo que se passou com a extinta XL Party que, segundo Pedro Silveira, terá passado a Lisboa Games Week precisamente para fornecer uma experiência de gaming mais diversificada e apelativa para o público em geral. Do lado de K1ck e FTW, os apelos eram no sentido de se ter cada vez mais e mais lucrativos eventos, para que as equipas possam também crescer, sem ver os seus maiores valores serem captados por equipas estrangeiras com outro poderio financeiro. E, de um ponto de vista de patrocinadores, as queixas são – e muito naturalmente – da relação custo-benefício do investimento que é penalizada por afluências de público que muitas vezes ficam aquém das expectativas. Discutiu-se, sobretudo, as necessidades de um maior investimento, de uma efectiva aposta no futuro dos eSports nacionais, e levantou-se a questão que ando a matutar há algum tempo: Dado o seu pioneirismo e dada a sua estrutura, porque não trata o Sporting Clube de Portugal de elevar a fasquia dos eSports nacionais? Afinal, trata-se de uma estrutura grande, coesa. O ordenado mensal de um jogador de segunda ou terceira linha de um clube de futebol dos grandes seria suficiente para pagar toda uma estrutura de eSports por um período superior a um ano. A resposta era mais ou menos esperada: Há interesse, há um início do estudo do mercado, mas os primeiros passos, esses, ainda são tímidos. E, claro, um investimento é suposto ter um retorno expectável, quer em termos financeiros, como, neste caso, de cultivo da imagem do clube associado.
Apontam-se os problemas, mas, no painel, ninguém parecia disposto a oferecer uma solução que permitisse aos eSports nacionais crescer. E, quando a discussão circulava em torno da problemática de eventos exclusivamente de eSports em Portugal e de como estes apresentam resultados incertos em termos de público, o que por sua vez dificulta novos investimentos, no seguimento do contraditório de Pedro Fernandes, que apontou recentes eventos exclusivamente de eSports que foram considerados um sucesso, João Semedo larga a bomba da tarde e arranca aplausos do público, com o anúncio precisamente de um ambicioso torneio de eSports, a realizar-se nos pavilhões da FIL, já para a primeira metade de 2017.
E é precisamente disso que a scene de eSports portuguesa precisa. Pedradas no charco. Apostas claras e inequívocas num mercado que cresce exponencialmente além-fronteiras e que, por cá, ainda vai andando de timidez em timidez. É isto! É isto que nos põe, de orelhas atentas, ansiosos, a aguardar pelos desenvolvimentos e anúncios.
Aguardemos,então.
Crónica do Rubber Chicken pela mão do Ricardo Mota
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