Análise realizada por Diogo Louro, na versão de PC.
Foi no início de 2022 que a ILCA, Inc – criadores dos remakes Pokémon Brilliant Diamond e Shining Pearl – e a Bandai Namco em celebração do 25º aniversário de One Piece, nos apresentaram a mais recente adaptação em vídeo jogo deste colossal universo criado por Eiichiro Oda, juntando-se assim à já recheada lista – 55 jogos para ser exato – que desde o início do século vêm sendo lançados para o mercado.
Desta vez um RPG com uma história totalmente original escrita pelo próprio autor e um gameplay inovador, prometendo fazer as delícias de todos os fãs de One Piece e de RPGs em geral. Na altura ainda estava a ver o anime, que conta até à data com 1048 episódios, e por isso o anúncio passou-me totalmente ao lado. Agora, tendo a oportunidade de experimentar o jogo no PC, embarquei numa aventura que só One Piece é capaz de dar e, “spoiler-alert”, não me dececionei.
Importante mencionar logo de início que o enredo do jogo se passa após o arco de Dressrosa e por isso se ainda não chegaste a este ponto da história fica aqui o aviso para alguns spoilers que possam surgir ao longo desta review. Para os que sabem do que falo e por isso não acham minimamente estranho e descabido o nome do arco, convido-vos a ficar para esta aventura comigo e todos os Straw Hat Pirates.
Uma Aventura Familiar e Diferente
Mal iniciamos o jogo somos imediatamente projetados para uma belíssima cutscene com o intuito de nos inteirarmos da situação presente. Luffy e os seus “nakama” naufragam na misteriosa ilha de Waford – mais uma para se juntar à longa lista no Novo Mundo – e percebem que por um lado o Sunny está destruído e Luffy perdeu o seu insubstituível chapéu de palha. Pouco tempo depois somos introduzidos a duas novas personagens originais: Lim e Adio que, como seria de esperar, não confiam em piratas, o que incluí os Straw Hats. Sem querer entrar em muitos spoilers, o grupo perde os seus poderes e vê-se obrigado a explorar a ilha e é aqui que a narrativa e, por consequente a ação, se divide em dois.
Vou abrir aqui um breve parêntese para partilhar com vocês o meu contentamento quando me debrucei sobre opções gráficas. Por um lado, não trazem nada de novo, permitindo alterar o nível das sombras, do anti-aliasing, DoF, etc…, o que é padrão para este tipo de jogos. A minha verdadeira surpresa foi quando percebi que não estava limitado a 60 FPS, o que em pleno 2023 é uma característica obrigatória para todos os jogos no PC, mesmo que a FromSoftware ache o contrário. Um aspeto menos positivo, que pode chatear alguns fãs é o facto de que apenas a dobragem em japonês está disponível, não havendo quaisquer planos por parte da Bandai Namco para adicionar qualquer outra no futuro. Para esta review joguei com uma NVIDIA GTX 1060 e consegui colocar o jogo nas opções gráficas máximas tendo por volta de 75-85 FPS.
Fechando parêntese e voltando à história, esta passa a ser então bipartida, onde o grupo ajuda Lim e Adio a derrotar uns colossos elementais que criam tempestades na ilha e paralelamente visita o mundo das memórias, caracteristicamente apelidado de Memoria – chocante, eu sei – criado por Lim, que permite às personagens, e por extensão ao jogador, reviver os mais icónicos arcos de One Piece, desde o magnífico arco de Alabasta até ao viciante e emocionante arco de Marineford.
A história não é assim nada que chegue a impressionar por quaisquer voltas e reviravoltas que tenha, mas para quem é fã deste mundo é uma fantástica viagem no tempo. Percebe-se então que o jogo é completamente focado para o fã “hardcore” e, para quem o é, Memoria apresenta um twist bastante engraçado, na forma de cenários “então e se-“ mostrando outras perspetivas dos antigos arcos.
Momentos como o de Luffy voltar a ver Ace em Alabasta são carregados de emoção para qualquer fã e toda esta receita funciona devido à excelente performance dos dobradores aliada ao estilo de arte em 3D apresentada pela ILCA, Inc, que apesar de ser diferente do estilo habitual acaba por assentar muito bem e até se tornar familiar. Estes em conjunto com a escrita característica de Oda, que é evidente no desenrolar de toda a história, contribuem para uma aventura que podia perfeitamente fazer parte de um filme da série.
Inovação com Pouca Profundidade
Chegamos então à parte que verdadeiramente importa: o gameplay. Este divide-se entre a exploração do mapa, Waford ou as memórias, com a resolução de puzzles em algumas dungeons – uso a palavra puzzle numa conotação muito livre, dada a fraca dificuldade destes – ou, recolha de itens espalhados pelo ambiente.
Fiquei satisfeito pelo facto de que esta pode ser feita com qualquer um dos Straw Hats e a mudança entre os mesmos é muito simples e rápida. Caso queiramos obter tudo é mesmo necessário explorar com várias personagens dado que algumas têm habilidades que permitem a recolha de certos itens exclusivos. Para além desta exploração padrão de qualquer RPG, temos as batalhas e é exatamente aqui que o gameplay mostra a sua melhor vertente, mas ao mesmo tempo as suas primeiras falhas. De forma simples, trata-se de turnos que usam uma mecânica de “pedra/papel/tesoura” e incorporam posicionamento aleatório conjugado com múltiplas zonas de combate, de forma a criar o que o próprio jogo apelida de “Scramble Area Battle”.
Cada inimigo e por extensão cada personagem possui um de 3, chamemos-lhes estilos de combate. Por exemplo, o Luffy pertence ao estilo Power, o Zoro ao Technique e o Usopp ao Speed e assim cada um destes apresenta vantagem contra um estilo e desvantagem contra outro. Dado isto, a opção de troca entre os membros ao longo da batalha é aconselhada e muito fácil, de forma a criarmos os melhores matchups possíveis. Este sistema foge ainda ao convencional RPG permitindo a livre escolha na ordem dos nossos ataques durante o turno, havendo a opção de troca entre os 4 personagens que estão ativos e os que estão na reserva sem qualquer penalização. É também informado ao jogador a ordem de ataque dos inimigos permitindo assim decidir de acordo com a mesma quem tem prioridade para ser eliminado.
A tudo isto junta-se talvez o elemento de maior complexidade, as múltiplas zonas de combate. Estas definem que uma personagem apenas pode progredir para outra zona quando derrotar todos os inimigos na sua zona, e assim obriga a algum exercício mental por parte do jogador para decidir quem deve atacar primeiro, que ataque deve ser usado, isto é, simples ou uma Skill, que na sua maioria são os icónicos ataques especiais que tanto vemos no manga/anime, e ainda a quem deve ser direcionado esse ataque.
O grande problema do combate e a meu ver o maior problema deste jogo é o facto de que qualquer estratégia que implementemos é desnecessária dado ao que considero a ridícula dificuldade apresentada, que é, ainda por cima, impossível de ser alterada. Tirando algumas exceções, como certos bosses, os inimigos que enfrentamos mal podem ser considerados uma ameaça.
Lembro-me particularmente de uma batalha que fiz no início do meu gameplay, onde por “aselhice” minha enganei-me a selecionar o alvo do meu ataque, deixando um inimigo pronto a atacar o Luffy e que após uma animação de ataque que parecia poderoso retirou-me uns míseros 32 de HP de um total de mais de 1300… Após isto decidi fazer um teste e simplesmente atacar sem qualquer estratégia e tenho-vos a dizer que apesar de mais demoradas, as batalhas tiveram sempre o mesmo desfecho, a minha vitória e pouco dano recebido.
Assim o sentimento de “overpowered” é constante, sentimento este que é exacerbado pelo que o jogo chama de “Dramatic Scenes” onde um objetivo extra durante a batalha é proposto de forma a recebermos mais experiência. Estes não variam muito do “derrota inimigo B com X personagem ou antes que alguma personagem seja eliminada – o que eu acho extremamente difícil – e o bónus de experiência que dão é simplesmente absurdo, sendo muitas vezes o dobro ou o triplo do normal, revelando um mau equilíbrio por parte dos desenvolvedores.
Um detalhe que não referi quando falei da exploração do mundo é o facto de ainda podermos ter os icónicos banquetes que existem sempre no final de cada arco do manga/anime. Estes, apesar de usarem sempre a mesma cutscene com diferentes cenários, são interessantes de se ver e ainda nos dão vantagens, como aumento de dano crítico nas batalhas, o que pesa ainda mais na fraca dificuldade apresentada.
Apesar de tudo isto, apreciei a inovação no sistema de combate, mesmo que esta se perca um pouco ao fim de algumas horas, e gostei principalmente das animações presentes nos icónicos ataques especiais de cada Straw Hat, que carregam o estilo e a comédia que One Piece sempre nos habituou e continua a habituar.
Relembrar o Passado
Gostaria de dedicar esta parte final da review para falar sobre o gameplay dentro do mundo das memórias. É aqui evidente o cuidado e carinho que a produtora teve em trazer os cenários dos arcos mais amados pelos fãs para o seu jogo. Os enormes desertos e as duas cidades totalmente exploráveis – Alubarna e Nanohana – no reino de Alabasta, o design intrigante e magnífico de Water Seven com as suas ruas ao estilo de Veneza e a atmosfera opressiva e caótica de Dressrosa pós destruição, são alguns dos ambientes que podemos explorar ao longo de todo o jogo. Dentro destes são apresentados alguns objetivos que devemos completar. Temos por um lado as missões principais que avançam o enredo, mas também algumas opcionais, que apesar de não terem o nível de cuidado e imersão de por exemplo um Witcher 3, são sempre agradáveis passatempos devido à interação familiar entre os Straw Hats.
Existe ainda um sistema de “bounties” onde somos encorajados a derrotar um NPC específico em troca de alguns berries. Este segue o conceito dos posters de procurado do manga/anime e o seu valor e consequentemente a sua dificuldade vai aumentado à medida que os completamos. Gostaria de salientar o pequeno diálogo que acontece entre diferentes personagens ao aceitarmos estes bounties que, por mais do que uma vez, me arrancaram uma ou duas gargalhadas. Adicionalmente dentro de alguns estabelecimentos é ainda possível trocar as roupas dos Straw Hats – infelizmente nas cutscenes a roupa não muda com a nossa escolha – cozinhar itens que nos curam e dão buffs e ainda criar “Trick Balls” carregadas de debuffs para os inimigos.
Por último, o pacing do jogo é infelizmente mais lento do que desejava, tendo missões principais que nos obrigam a fazer um vaivém constante entre localizações que já explorámos. Isto é especialmente notável em Alabasta onde o início é demasiado lento para agarrar a atenção do jogador. Este sentimento vai diminuindo ao longo do desenrolar da trama, mas está sempre presente. Aliado a isto, e como seria de esperar de um RPG que ainda por cima adapta uma longuíssima história repleta de personagens, o jogo tem uma grande quantidade de cutscenes principalmente de 10-20 segundos que a meu ver quebram em demasiado a ação e chegam a causar aborrecimento.
De Fãs para os Fãs
De forma geral, One Piece: Odyssey é uma excelente adição à já vasta lista de adaptações em videojogo deste universo, mas não chega a impressionar no quesito de história ou gameplay. É nitidamente uma experiência desenhada para os fãs da série e desta forma, jogadores que não conheçam a história ou que simplesmente procurem um bom RPG vão se sentir desapontados. Para os outros, são cerca de 30-35 horas de momentos engraçados e caóticos conduzidos por uma história repleta de fan-service, à moda habitual de One Piece, que tenta por mais do que uma vez puxar uma resposta mais emotiva por parte dos verdadeiros fãs da série.
Mesmo com todos estes positivos, um nível de dificuldade que considero inexistente durante 90% do jogo aliado ao, na superfície interessante, mas, de forma geral repetitivo e de certa forma monótono sistema de combate tornam a experiência agridoce e apenas para alguns.
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